Brasis com problemas
Por que os planos de crescer rapidamente com compras sucessivas e ganhos de sinergia não deram certo para Brasil Brokers, Insurance e Pharma

brasisSe o Brasil vai ajustar sua economia no próximo mandato presidencial ainda não se sabe. Mas nas empresas que levam o País no nome a arrumação da casa já começou. Brasil Brokers, Brasil Insurance e Brasil Pharma apostam na reestruturação e na redução de custos para mostrar resultado. Todas passaram por mudanças na gestão e frearam as aquisições que as fizeram crescer rapidamente. Adeptas do chamado modelo “roll up”, baseado na consolidação de mercados fragmentados, elas agora têm de entregar os ganhos de sinergia que propalavam conseguir.

O tombo das ações denota as dificuldades por que passam essas companhias. Os papéis da Brasil Pharma acumulam baixa de 55,09% desde a oferta pública inicial de ações (IPO, na sigla em inglês), feita em 2011, até o dia 24 de novembro, de acordo com a Economatica. As ações da Brasil Insurance, que também veio a mercado em 2011, caíram 57,14%; as da Brasil Brokers, 62,17% desde 2007. Todas as baixas são bastante superiores à do Ibovespa no mesmo intervalo.

Num primeiro momento, Brasil Brokers, Insurance e Pharma cresceram fortemente por meio da compra de companhias menores e ganharam a mãozinha do bom desempenho da economia. “Não diria que deixamos para obter os ganhos de escala num segundo momento, mas, como o mercado estava favorável, as vendas eram prioridade zero”, afirma Silvio Almeida, diretor de relações com investidores da Brasil Brokers, que atua no ramo de corretagem de imóveis.

Ou seja, era possível crescer sem ter o máximo de eficiência. Agora, a empresa não pode se dar a esse luxo. A padronização de processos e sistemas e a captura das sinergias tornaram-se urgentes. A estratégia que deu origem à Brasil Brokers, defende Almeida, é correta: “Conseguimos em sete anos atingir um tamanho que demoraríamos 80 para alcançar de forma orgânica”, argumenta. Segundo ele, esse é o grande benefício do roll up: queimar etapas do crescimento. O diretor explica que o modelo faz ainda mais sentido num ramo cíclico como o imobiliário, pois permite a conquista rápida de ganhos em tempos de mercado aquecido. Foi o que a Brasil Brokers fez, ao se aproveitar do boom imobiliário entre 2007 e 2011. Na época, não raro, vendiam-se 90% das unidades de um projeto na semana do lançamento.

Das três holdings consolidadoras, a de farmácias é a que tem mais potencial para se beneficiar do modelo

Hoje, a situação é outra, e os números escancaram a dura realidade. Nos três trimestres deste ano, a companhia registrou lucro líquido 80% inferior ao do mesmo período do ano passado: R$ 9,9 milhões contra R$ 80 milhões (em 2013, a queda havia sido de apenas 2%). Para reverter esse cenário, a Brasil Brokers deu início a uma reestruturação. Em abril deste ano, um presidente novo foi eleito: Plínio de Serpa Pinto, um dos fundadores da companhia e até então no comando de uma subsidiária (a Brasil Brokers Niterói), assumiu o posto no lugar de Sergio Freire, que a dirigiu por sete anos.

O desafio dele será alcançar os benefícios pretendidos com a união de 24 corretoras imobiliárias sob a holding. As três que operam em São Paulo (Abyara, Avance e Brasil Brokers SP) já contam com uma estrutura administrativa única, que presta apoio jurídico e realiza serviços financeiros e de tecnologia da informação. O portfólio de lojas no País foi revisto e algumas unidades, reduzidas. Outra medida para subtrair despesas foi a centralização dos processos de contratação de serviços utilizados pelas várias unidades. Tome-se como exemplo o plano de saúde dos funcionários: antes adquirido individualmente pelas várias corretoras, passou a ser negociado pelo grupo.

Ao todo, cerca de 600 iniciativas para cortar custos foram implementadas, das quais 100 são as mais relevantes e representam 70% das possibilidades de ganho. O projeto começou há oito meses e deve durar mais quatro. Almeida espera que os frutos apareçam ainda este ano e se concretizem em 2015. Algo já pode ser visto nos resultados: os custos e despesas caíram 8% no terceiro trimestre de 2014 em comparação ao mesmo período de 2013. Analistas consideram a providência positiva, mas acreditam que não será suficiente para compensar a queda na receita líquida — de 22% entre julho e setembro deste ano, em relação ao mesmo período de 2013. As aquisições estão temporariamente suspensas; a última ocorreu no primeiro semestre de 2012. Os baixos múltiplos da Brasil Brokers desincentivam a compra de novas corretoras, que se dá com pagamento parcial em ações.

Almeida pondera os impactos da pausa nas aquisições. Ele acredita que o mercado imobiliário está vivendo um momento de excesso de pessimismo, mas deve retomar o ritmo em 2016. Sua prioridade, agora, é expandir por meio da atração de corretores de empresas menores. Noutras palavras: em vez de comprar corretoras, como fazia, a Brasil Brokers quer suas equipes de vendas — uma forma bem mais barata de obter receita.

brasis2Bandeira vermelha
Percurso semelhante foi o da Brasil Insurance, que também aglutinou pequenas corretoras — no caso, de seguros. Sua dificuldade resultou não só do enfraquecimento da economia, mas também de problemas operacionais e de governança. “A proposta de valor oferecida para as corretoras não aconteceu”, admite o novo CEO da empresa, Edward Lange, que assumiu o cargo em maio deste ano, vindo da presidência da Allianz no Brasil, com a tarefa de tornar a companhia sustentável. A constatação da nova equipe de gestão é que o modelo de crescer por meio de aquisições estabelecido pela Brasil Insurance não seria viável no longo prazo. Para garantir a sobrevivência, a companhia precisa se expandir de forma orgânica.

Impulsionada pela valorização do papel na bolsa, a Brasil Insurance privilegiou a compra de corretoras e deixou em segundo plano os ganhos que poderiam vir da unificação das estruturas de tecnologia, de recursos humanos, contábil e financeira. “Como as ações estavam em alta, ninguém questionava se o modelo de aquisições não integradas era viável. O mercado começou a olhar isso com a queda dos papéis”, observa Lange.

O alerta veio com os resultados inferiores ao esperado: o lucro líquido caiu 58% no último trimestre de 2013 em relação ao mesmo período de 2012 (em todo o ano passado, a queda na última linha do balanço havia sido de 7%). Além disso, a notícia de que conselheiros de administração venderam ações em janeiro, antes da divulgação dos números do ano passado, minou a confiança dos investidores. Naquele mês, membros do conselho de administração reduziram sua participação de 1,9% do capital da companhia para 1,4%, e a diretoria, de 1,1% para 1%. Esse movimento, atendendo aos requisitos da Instrução 358 da CVM, se tornou pública em 11 de março. As vendas causaram desconforto no mercado, ainda mais porque pouco depois, em 28 de janeiro, a empresa anunciou resultados ruins (leia mais no quadro acima).

Segundo Samuel Torres e Marcio Maeda, analistas do Banco Fator, a companhia praticamente dobrou, mas não conseguiu os ganhos de sinergia esperados. As margens e os resultados pioraram, porque a empresa não planejou bem as aquisições. No IPO, a Brasil Insurance possuía 27 corretoras; hoje, são 52. Os analistas acreditam que a estratégia de consolidar o mercado também está em risco. O problema é o mesmo da Brasil Brokers: como as cotações caíram muito, ficou mais caro fazer novas compras. As aquisições, nesse contexto, teriam de usar mais recursos do caixa.

A continuidade das compras de empresas, entretanto, não faz parte dos planos, diz Lange: “Só compraremos corretoras se elas puderem ser integradas em três meses, se estiverem num segmento em que precisamos de expertise ou se participarem de algum mercado estratégico no qual não estejamos presentes”. No seu caso, a ideia é também adquirir, em vez de empresas, itens menos custosos — como canais de distribuição, por exemplo.

A saída de apostar na expansão orgânica, por sua vez, não teve resultados satisfatórios, ponderam os analistas da Fator. Eles têm dúvidas sobre a efetividade da atual aposta da empresa em aumentar as vendas cruzadas (venda de diferentes seguros para os mesmos clientes). “Os resultados devem aparecer na metade de 2015, mas não são suficientes para justificar o atual preço dos papéis na bolsa. Eles ainda estão caros”, considera Torres.

brasis3Erro estratégico
Na Brasil Pharma, que tem a proposta de atuar como consolidadora do mercado de farmácias, analistas consideram que, ao lado das dificuldades naturais de capturar os ganhos de sinergia, houve erros fundamentais. O principal foi aumentar fortemente os estoques para manter o nível de serviço nas lojas, dando várias opções aos clientes, o que acabou pressionando os custos.

Agora, a companhia trabalha para se desfazer da quantidade excedente de produtos que comprou. A arrumação começou em novembro de 2013 e teve um efeito colateral: a queda nas margens. Para reduzir o estoque, elevado também devido ao processo de integração das redes de farmácias e centros de distribuição de medicamentos da companhia, a Brasil Pharma precisou ofertar produtos com desconto. A medida foi, ainda, necessária para desovar os muitos remédios próximos à data de vencimento. Outro fator de redução da lucratividade tem sido a baixa fatia dos genéricos, que têm margens maiores, nas vendas.

Neste ano, a Brasil Pharma acumulou prejuízo de R$ 420 milhões até setembro. O caixa sofreu declínio de R$ 550 milhões, devido ao descumprimento, por dois trimestres consecutivos, de cláusulas de endividamento (“covenants”) de uma emissão de debêntures. Isso obrigou a empresa a resgatar antecipadamente os papéis da primeira e da segunda série da oferta. Um alívio veio em maio, com a aprovação de um aumento de capital de R$ 400 milhões subscrito pelo BTG Pactual, seu maior acionista, e a contração de um empréstimo de R$ 230 milhões. Em junho, a Moody’s rebaixou a nota de crédito corporativo da Brasil Pharma, de estável para negativa.

Atualmente, a empresa tem 1.209 lojas: 723 são próprias, das redes Econômica, Big Ben, Rosário e Sant’Anna; 486 são franquias da marca Farmais. Diante das dificuldades, o grupo deve desacelerar o crescimento para tornar as operações mais rentáveis e elevar a geração de caixa. De 2013 até o terceiro trimestre de 2014, dez lojas próprias fecharam as portas. No primeiro semestre, 1.600 funcionários foram demitidos.

A expansão agora deve se dar pela rede Farmais, com o objetivo de recuperar a rentabilidade. Assim como as outras Brasis, a Brasil Pharma vivenciou a troca de seu principal executivo. José Ricardo Mendes da Silva, ex-presidente do laboratório Aché de 2006 a 2013, assumiu o posto em março deste ano, no lugar de André Soares de Sá, que estava na companhia desde a fundação. A Brasil Pharma declinou o pedido de entrevista feito pela capital aberto.

Apesar de saudarem os esforços da companhia para dar a volta por cima, os analistas não veem grande potencial para as ações num horizonte próximo. “No longo prazo, assumindo que a casa seja colocada em ordem, o cenário tende a ser melhor, principalmente em razão das boas perspectivas para o setor de varejo farmacêutico”, afirma Gabriel Casonato, da Empiricus Research.

Das três holdings consolidadoras, a de farmácias é a que tem mais potencial para se beneficiar do modelo, considera Evaldo Fontes, sócio da consultoria Araújo Fontes. As outras duas, por fazerem vendas personalizadas (de seguros e imóveis), têm de manter as estruturas mais independentes; na Brasil Pharma, que comercializa produtos em vez de serviços, há outras oportunidades, como a centralização das compras e da distribuição. Serão as reformas em curso nas três Brasis suficientes para ajustá-las? O ano de 2015 trará ao menos parte da resposta. Enquanto isso, as promessas do modelo de roll up, tão festejadas nos IPOs, transformam-se em desilusão.

Ilustração: Marco Mancini/Grau180.com


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